"CLICK" VIRA SOLUÇÃO PARA O TERCEIRO SETOR
Empresas & Carreiras | Maio de 2000
Instituições sociais aderem à arrecadação de fundos
via Internet: usuário decide onde doar,
e as empresas privadas patrocinam
Instituições sociais aderem à arrecadação de fundos
via Internet: usuário decide onde doar,
e as empresas privadas patrocinam
Por Rachel Cardoso e Daniele Madureira de São Paulo
Esqueça as tradicionais - e às vezes impertinentes - ligações de entidades assistenciais, pedindo a sua colaboração. Em um mundo globalizado, as instituições do Terceiro Setor descobriram uma maneira muito mais prática de captar recursos: basta convencer o internauta a navegar pelas páginas das organizações não-governamentais (ONGs) e dar um "click" no mouse, para que a doação seja realizada. Quem paga a conta são as empresas patrocinadoras dos sites, cada vez mais interessadas em melhorar sua imagem institucional. Um dos exemplos mais bem sucedidos é o Clickfome, que acaba de receber o Prêmio iBest na categoria Ações Sociais: o site está no ar desde novembro e já contabilizou quase 1 milhão de page views. Cada vez que o intemauta acessa a página, grandes patrocinadores - como Foro. Rio Sul, Fininvest e Ogeda - contribuem com R$ 0,05 ou R$ 0,10, dependendo do espaço publicitário utilizado por cada um.
A renda é revertida para as campanhas "Natal sem Fome", em que todos os recursos são transformados em alimentos, e para a "Bolsa Escola", de distribuição de renda. Segundo o coordenador Maurício Andrade, os contratos fechados até agora vão proporcionar um salário mínimo mensal, ou uma bolsa escola, para dez famílias durante um ano. A meta é atender 50 delas ainda em 2000, por meio dos fundos arrecadados na Web. "A Intemet agiliza as doações e as empresas divulgam sua imagem em uma mídia poderosa", diz.
A Ogeda lnformática, patrocinadora do Clickfome, já colhe resultados positivos. "Recebemos com freqüência e-mails parabenizando a iniciativa", diz a assistente de marketing Ana Cáudia Novaes.
O mesmo modelo está sendo empregado pelo "Hunger Site", uma idéia norte-americana que ganhou versão brasileira há uma semana, ao ser implantada como "bunner" no site Filantropia.org, da Kanitz & Associados.
A cada clique, são doados R$ 0,03, o equivalente a 100 gramas de arroz e 80 gramas de feijão às 400 entidades eleitas pelo Prêmio Bem Eficiente. Quem coloca a mão no bolso são grandes empresas patrocinadoras, como Americanas.com e Brasil Realty, interessadas nos benefícios do marketing social.
Segundo o diretor da Kanitz & Associados: Stephen Kanitz, o maior objetivo é incentivar a doação do cidadão comum: depois de ceno número de cliques, o intemauta será convidado afazer a própria contribuição. "No Brasil, 90% das doações vêm das empresas e do governo, enquanto apenas 10% representam a contribuição da classe média. Nos Estados Unidos, essa relação é inversa".
A julgar pelo número de cliques realizados nos mais novos sites do Terceiro Setor, a classe média está disposta a participar. A página "Mude o Brasil em Um Minuto", campanha virtual da Comunidade Solidária lançada em janeiro, já contabilizou mais de 700 mil cliques, inclusive fora do País. Embratel, Motorola, Itaú e Ambev estão entre as 15 empresas patrocinadoras, que se comprometeram a doar, cada uma, R$ 2 milhões para a campanha. O objetivo é capacitar 20 mil jovens nos próximos dois anos.
"Existe um grande potencial a ser explorado pelas ONGs na Web, não só na captação de recursos, mas principalmente com a divulgação de campanhas", diz Márcio Schiavo, diretor da Comunicarte, consultoria para o Terceiro Setor, e também diretor de comunicação do Instituto Ayrton Senna. Segundo Schiavo, o instituto pretende lançar sua home page ainda este ano, mas deve focar as ações apenas em campanhas institucionais. "O intemauta vai escolher como contribuir. Pode optar, por exemplo, pela assinatura do cartão de crédito Ayrton Senna, mantido em parceria com a Credicard", diz.
A credibilidade do instituto fez com que a ONG se tomasse um pólo de atração para empresas interessadas em investir no Terceiro Setor. O Superbird.com é um dos candidatos. A proposta do site é se tornar o canal exclusivo e permanente para leilões do instituto, comercializando as marcas Ayrton Senna e Senninha.
"A transmissão de imagens e a interatividade fazem da rede mundial nm meio de divulgação muito mais eficaz, em relação às tradicionais formas de marketing direto usadas pelas instituições", diz Cristiane Colpas, diretora de marketing da consultoria Neryvalle.
Uma boa causa também pode ser defendida com um "click" quando o assunto é leilão virtual. Pelos sites Lokau e Arremate, é possível arrematar peças doadas por personalidades e pelo setor privado, com renda destinada às instituições, "Nós nos surpreendemos com o retomo da iniciativa. A venda do véu da Feiticeira. por exemplo, teve lance inicial de R$ 1 e chegou a R$ 1,7 mil", diz a gerente da área social do Lokau, Daniela Ferreira de Aquino.
Todo esse interesse em fazer parte do mundo virtual já foi medido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), responsável pelos registros na Web, O número de registros com o domínio "ponto org" (.org), destinado às instituições sem fins lucrativos, dobrou nos últimos doze meses. Atualmente, 4.815 entidades estão on-line. Em 1998, este número beirava os 1,7 mil e, em 1996, apenas 34 instituições estavam conectadas.
Para disseminar a tecnologia digital às organizações sem fins lucrativos foi criada há três anos outra ONG, a Rede de Informações para o Terceiro Setor (RITS), que recebe apoio da Unesco, do BID e do setor privado. A RITS está desenvolvendo um sistema para integrar cerca de 170 associadas em todas as regiões do País. "Nenhum setor pode ignorar a Internet. Estar na Web significa maior eficácia e menor custo na divulgação de projetos e na troca de informações", diz o diretor de desenvolvimento Carlos Afonso.
Para a Abrinq, a Internet é uma ferramenta para a mobilização. "E possível abrir espaço para discussões como a do trabalho infantil", diz Luís Vieira Rocha, gerente de mobilização social. Na Web, a entidade mantém parceria com os cartões Unibanco e Bradesco: os correntistas fazem doações, clicando em um "Link" da Abrinq. A associação com o Bradesco se repete na Casas André Luiz, que atendem deficientes mentais e crianças carentes: no site da instituição, há "Link" direto com a página do banco. A ação incrementa o orçamento mensal da entidade, de R$ 2 milhões.
Doação fortalece imagem Ostentar uma boa imagem também faz parte da estratégia de empresas da nova economia, que já nascem com base numa política social. Um dos projetos da Cipó Comunicação Interativa, uma organização não governamental educativa da Bahia, por exemplo, foi concebido de olho no patrocínio do iG.
"Li numa entrevista que a direção do iG desejava investir nesse setor", conta a diretora da entidade, Anna Penido. O site iGuais, produzido por jovens entre 15 e 25 anos para o público adolescente, será bancado pelo portal. "A idéia é também estimular o uso educativo da Web", diz a diretora da Cipó, Anna Penido.
Apesar de o "samaritanismo" não ser o fator determinante, redes como Lojas Americanas, Ponto Frio, Submarino, Siciliano e Saraiva estão aderindo à versão brasileira do Socialevents.com, site norte-americano de serviços para companhias eletrônicas. A empresa mantém um programa específico, o Global GiftAid, destinado à instituições sem fins lucrativos.
"Cadastramos ONGs para que possam receber presentes em vez de dinheiro, de qualquer parte do mundo, de acordo com suas necessidades", explica o CEO da Socialevents.com, Robert Endosso. Para o gerente de marketing da Siciliano, Marco Aurélio Barbosa, esse tipo de iniciativa é o casamento perfeito do comercial com o social. "É mais uma forma de fortalecer nossa imagem institucional fora do País", diz.
A Fundação O Boticário, voltada à preservação da natureza, é outra que está empenhada em fazer de sua home page uma vitrina de compras: até junho, o site vai vender produtos para complementar a receita da fundação.
Mantida pela indústria paranaense O Boticário, de perfumes e cosméticos, a idéia é tomar a versão o mais interativa possível. Com um orçamento anual de R$ 3,3 milhões previsto para 2000, a entidade arrecada cerca de 70% dos recursos junto à empresa mantenedora, e o restante provêm do comércio de produtos e parcerias.
A página da Associação de Assistência à Criança Defeituosa (AACD) é mais urna que será reciclada, de olho na arrecadação virtual. "O site atual está no ar há quatro anos, por obra de um voluntário. A remodelação vai enfocar principalmente doações.